África do Sul diz que mais de 50 países expressaram apoio à queixa apresentada no tribunal de topo das Nações Unidas, contra Israel. O país é acusado de genocídio contra os palestinianos na guerra em Gaza.
Vários países, incluindo os Estados Unidos, rejeitaram veementemente a alegação da África do Sul de que Israel está a violar a Convenção das Nações Unidas para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio. Vários outros países mantiveram o silêncio.
A reação internacional ao processo histórico que foi ouvido na quinta e sexta-feira no Tribunal Internacional de Justiça em Haia mostra uma divisão global previsível quando se trata do inextricável problema de 75 anos entre Israel e os palestinianos.
Quem são os países que apoiam a iniciativa da África do Sul?
No domingo assinalam-se 100 dias do conflito. A maioria dos países que apoiam a iniciativa da África do Sul são do mundo árabe e de África.
Nenhum país ocidental declarou apoio às alegações da África do Sul contra Israel. Os EUA, um aliado próximo de Israel, rejeitaram-nas como infundadas, o Reino Unido considerou-as injustificadas e a Alemanha afirmou que as “rejeita explicitamente”.
A China e a Rússia pouco disseram sobre um dos processos mais importantes apresentado num tribunal internacional na história recente. A União Europeia também não comentou.
As Reações da UE, dos EUA e do Reino Unido
Numa visita a Israel, um dia antes do início do processo judicial, o Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, criticou as alegações da África do Sul e considerou que o processo “distrai o mundo” dos esforços para encontrar uma solução duradoura para o conflito.
O porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby, disse que genocídio “não é uma palavra que deva ser usada de ânimo leve, e certamente não acreditamos que se aplique aqui”.
“Não concordamos com o que os sul-africanos estão a fazer”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, David Cameron.
Israel rejeita ferozmente as alegações de genocídio e diz que está a defender o seu povo. A ofensiva tem como objetivo erradicar os líderes do Hamas, o grupo militante que governa o território e que provocou o conflito ao lançar ataques surpresa no sul de Israel a 7 de outubro.
Blinken disse que um caso de genocídio contra Israel era “particularmente irritante”, dado que o Hamas e outros grupos “continuam a apelar abertamente à aniquilação de Israel e ao assassínio em massa de judeus”.
Os EUA, o Reino Unido, a UE e outros países classificam o Hamas como uma organização terrorista.
Uma guerra mortífera
A resposta militar de Israel em Gaza já matou mais de 23 mil palestinianos, segundo o Ministério da Saúde de Gaza. A contagem não faz distinção entre combatentes e civis. Mais de dois terços dos mortos são mulheres e crianças.
Grande parte do norte da Faixa de Gaza tornou-se numa paisagem inabitável, com bairros inteiros destruídos pelos ataques aéreos israelitas e pelos disparos dos tanques.
A África do Sul também condenou o ataque do Hamas de 7 de outubro, mas argumenta que este não justifica a resposta de Israel.
O apoio alemão a Israel
A declaração de apoio da Alemanha a Israel, na sexta-feira, dia em que foram encerradas as audiências, tem um significado simbólico, dada a sua história do Holocausto, quando os nazis mataram 6 milhões de judeus na Europa. Israel foi criado após a Segunda Guerra Mundial como um refúgio para os judeus.
“Israel tem-se defendido”, afirmou o porta-voz do governo alemão, Steffen Hebestreit. A sua declaração também invocou o Holocausto, que em grande parte estimulou a criação da Convenção das Nações Unidas sobre o Genocídio em 1948.
“Tendo em conta a história da Alemanha (…) o Governo Federal considera-se particularmente empenhado na Convenção contra o Genocídio”, afirmou. Ele considerou as alegações contra Israel como “completamente infundadas”.
A Alemanha afirmou que tenciona intervir no processo em nome de Israel.
A UE limitou-se a dizer que os países têm o direito de apresentar queixas ao tribunal da ONU. A maioria dos seus Estados-Membros absteve-se de tomar uma posição.
Turquia apoia processo contra Israel
O Presidente turco Recep Tayyip Erdogan afirmou que o seu país forneceu documentos que estavam a ser utilizados contra Israel no processo. “Com estes documentos, Israel será condenado”, afirmou o chefe de Estado da Turquia.
A Turquia possui o estatuto de país candidato à UE desde 1999. Mas, de acordo com o Conselho Europeu “na sequência do contínuo retrocesso da Turquia nos domínios da democracia, do Estado de direito e dos direitos fundamentais, as negociações de adesão entre a UE e a Turquia encontram-se num impasse desde junho de 2018.
Organização de Cooperação Islâmica apoia processo contra Israel
A Organização de Cooperação Islâmica (OCI) foi um dos primeiros blocos a apoiar publicamente o processo, quando a África do Sul o apresentou, no final do mês passado. A OCI afirmou que “as forças de defesa israelitas estão a perpetrar um genocídio em massa” e acusou Israel de “atacar indiscriminadamente” a população civil de Gaza.
A OCI é um bloco de 57 países que inclui o Irão, o Iraque, a Arábia Saudita, o Qatar e o Egipto. A sua sede é na Arábia Saudita. A Liga Árabe, com sede no Cairo, cujos 22 países membros fazem quase todos parte da OIC, também apoiou o caso da África do Sul.
A África do Sul obteve algum apoio fora do mundo árabe. A Namíbia e o Paquistão concordaram com o caso numa sessão da Assembleia Geral da ONU esta semana. A Malásia também manifestou o seu apoio.
“Nenhum ser humano que preza a paz pode ignorar a carnificina perpetrada contra os palestinianos em Gaza”, afirmou o Presidente da Namíbia, Hage Geingob, segundo o jornal The Namibian, do país da África Austral.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros da Malásia exigiu “responsabilização legal pelas atrocidades cometidas por Israel em Gaza”.
Silêncio da China e da Rússia
A China, a Rússia (que enfrenta acusações de genocídio no tribunal mundial) e a Índia mantiveram-se em silêncio, aparentemente conscientes de que tomar uma posição num caso tão inflamado tem poucas vantagens e pode perturbar irreversivelmente as suas relações na região.
A política externa da Índia tem apoiado historicamente a causa palestiniana, mas o Primeiro-Ministro Narendra Modi foi um dos primeiros líderes mundiais a expressar solidariedade com Israel e a classificar o ataque do Hamas como terrorismo.
Brasil apoia processo contra Israel
Alguns países sul-americanos manifestaram-se sobre a questão, incluindo a maior economia do continente, o Brasil. O Ministério das Relações Exteriores Brasileiro disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva apoiou a iniciativa da África do Sul.
No entanto, os comentários do ministério não acusaram diretamente Israel de genocídio, mas centraram-se na necessidade de um cessar-fogo em Gaza.
O processo contra Israel tem duas vertentes: a África do Sul quer que o tribunal declare que Israel está a cometer genocídio e que emita uma decisão provisória ordenando o fim da sua campanha militar em Gaza.
O tribunal disse que iria decidir sobre uma decisão provisória em breve, mas, tendo em conta a gravidade das acusações, um veredito final sobre a acusação de genocídio poderia levar anos.
O Brasil disse esperar que o processo leve Israel a “cessar imediatamente todos os atos e medidas que possam constituir genocídio”.
Fonte: euronews.pt