Treze mulheres e crianças de um lado, 39 mulheres e jovens do outro: são estes os números da primeira troca de reféns levados de Israel e de prisioneiros palestinianos, que deverá ocorrer nesta sexta-feira, assim não haja mais um adiamento de última hora como o que ocorreu na véspera. Até ao calar temporário das armas, o exército israelita continuou a bombardear alvos, inclusive no sul da Faixa de Gaza, tendo só em Rafah matado 14 pessoas. Já o ministro da Defesa avisou que a guerra irá durar pelo menos mais dois meses.
Desiludam-se os que esperam que a trégua possa prolongar-se no tempo. O primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu já o reiterara, mas desta vez coube a Yoav Gallant avançar com mais pormenores sobre os planos da guerra. Em visita a uma unidade de operações especiais da marinha, o ministro da Defesa classificou como uma “breve pausa” os próximos dias. “No final, os combates continuarão intensamente e exerceremos pressão para que sejam libertados mais reféns. Espera-se pelo menos mais dois meses de combates”, disse ao 48.º dia de guerra.
Já o porta-voz das forças de Israel, Daniel Hagari, enquanto disse que do seu lado se planificam as próximas etapas, fez uma advertência: “O Hamas tentará utilizar os dias do acordo para espalhar o medo, a desinformação e o terror psicológico. O acordo não é o fim do processo, mas sim o início.”
Os termos da trégua que devem durar pelo menos quatro dias foram confirmados pelo braço armado do Hamas, as brigadas al-Qassam, bem como pelo Qatar e pelo Egito. A partir das 7.00 locais (5.00 em Portugal continental) a violência armada cessa e às 16.00 são libertados os primeiros 13 de um mínimo de 50 reféns. De três prisões vão sair 39 palestinianos às 18.00 para a Cisjordânia e Jerusalém Oriental.
Uma exigência israelita que terá atrasado o início da trégua (assim como a articulação com a Cruz Vermelha), a lista de reféns a libertar foi dada a conhecer a Telavive, que informou entretanto os familiares, mas não a tornou pública.
Instado a revelar pormenores sobre os que serão restituídos à liberdade, o presidente dos Estados Unidos disse não poder entrar em pormenores até a operação estar concluída, mas sempre adiantou que “mantinha os dedos cruzados” para que uma menina de três anos de nacionalidade norte-americana, cujos pais foram mortos no ataque terrorista de 7 de outubro, esteja entre os 13. Numa declaração anterior, Joe Biden havia dito que também se espera a libertação de duas mulheres dos EUA.
No que respeita ao mínimo de palestinianos a libertar das prisões israelitas, 150, o número equivale a metade dos que foram detidos nas últimas horas na Cisjordânia (num total de 3130 desde 7 de outubro). Segundo os media israelitas, a maioria vive em Jerusalém Oriental. Alguns têm 14 anos e foram acusados de crimes tão diversos como “lançar pedras”, “apoio ao terrorismo” ou “tentativa de homicídio”.
Atirar pedras às forças israelitas é punível com pena de prisão até 20 anos. Segundo a ONG DCIP, em cada ano entre 500 e 700 menores palestinianos são detidos e incriminados por esse crime.
Em paralelo, vão entrar 200 camiões com ajuda humanitária e quatro com combustível em cada dia de pausa no conflito. Antes de 7 de outubro, o número médio diário de veículos pesados que entravam no território era de 500. Além disso, segundo as brigadas al-Qassam, o exército israelita compromete-se a não sobrevoar o sul da Faixa de Gaza durante o período nem durante seis horas diárias na cidade de Gaza e no norte do enclave.
Mortos superam libertados
As forças de Telavive não pouparam esforços nas últimas horas. Na quarta-feira dizem ter atacado 300 posições do Hamas, e na quinta-feira voltaram a bombardear o território de norte a sul. Em Rafah, a cidade junto à passagem fronteiriça com o Egito, terão morrido 14 pessoas em bombardeamentos diferentes, segundo o diretor do hospital Abu Youssef Al-Najjar.
No extremo oposto, em Jabalia, um ataque israelita matou 27 refugiados abrigados numa escola da ONU, disse a autoridade de Saúde de Gaza. Se a estas mortes se somarem as relatadas pela agência noticiosa Wafa (dez em Sheikh Radwan, no norte de Gaza, e cinco em Khan Younis), o número de vítimas mortais entre a população, só dia anterior à trégua superou o de pessoas a serem libertadas nesta sexta-feira.
A mais recente contagem das autoridades de Gaza aponta para pelo menos 14854 mortos, dos quais 6150 menores.
Também a milícia libanesa Hezbollah, que anunciou cumprir a trégua, aproveitou as últimas horas para elevar o patamar de atividade bélica. Segundo a organização xiita, foram lançados 20 ataques que terão causado baixas no norte de Israel, e só num ataque lançaram 48 foguetes Katyusha contra uma base militar israelita. Do lado de Telavive contaram 35 foguetes e foi dito que a maioria foi intercetada pelas defesas aéreas. O ataque foi o maior oriundo do Líbano desde o início da guerra Israel-Hamas e, em resposta, helicópteros e aviões de combate atingiram “infraestruturas terroristas” do Hezbollah, bem como locais de lançamento de foguetes.
A violência no sul do Líbano já levou ao deslocamento de 26 mil pessoas e à morte de 109 pessoas, a maioria das quais combatentes do Hezbollah. Entre as vítimas mortais conta-se o filho de um deputado do Hezbollah, Mohamed Raad, juntamente com outras quatro pessoas, duas das quais líderes da força de elite Al-Radwan do Hezbollah, noticiou a AFP. Do lado israelita morreram nove pessoas.
Netanyahu ouve críticas de Sánchez
No mesmo dia, os chefes dos governos da Bélgica e de Espanha e o novo ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido reuniram-se com o presidente e com o líder do governo de emergência de Israel. Enquanto de David Cameron só se ouviram palavras de apoio a Israel, Alexander De Croo e Pedro Sánchez, em visita conjunta, distribuíram apoio e palavras críticas ao mesmo tempo. “Que esta não seja uma oportunidade perdida de dar um passo em direção à paz”, disse o dirigente belga sobre a trégua.
Depois de Netanyahu ter mostrado imagens do terror perpetrado nos ataques de 7 de outubro aos visitantes, o espanhol recordou que o seu país também viveu com o terrorismo, mas que conseguiu virar a página da ETA. “Estou convencido de que o terrorismo não pode ser erradicado apenas com o uso da força”, disse Sánchez, que lamentou a resposta israelita em Gaza: “O número de palestinianos mortos é verdadeiramente insuportável. Há que fazer distinção clara entre objetivos militares e a proteção dos civis.”
Fonte: dn.pt por cesar.avo@dn.pt