As guerras em curso não têm fim à vista, no entanto a probabilidade de um conflito direto entre as duas maiores potências baixou na sequência do encontro entre os seus líderes, Joe Biden e Xi Jinping. Uma pequena grande vitória de meses de diplomacia que ficou plasmada na imprensa chinesa, numa mudança acentuada de tom em relação aos Estados Unidos desde a véspera da reunião.
Em 1985, Xi Jinping visitou os EUA pela primeira vez. Fazia parte de uma delegação da província de Hebei interessada em conhecer a indústria de processamento alimentar no estado do Iowa. Em 2012, já vice-presidente chinês, voltou àquele estado e ficou para a história uma fotografia de um sorridente Xi ao volante de um trator, em quebra do protocolo.
Dessas visitas nasceram relações de amizade, desde a família que o hospedou na década de 80 ao agricultor que o convidou a saltar para o seu John Deere. Estes e outros “velhos amigos” que Xi conheceu no Iowa – alguns aprofundaram entretanto os laços com a China – estiveram presentes no jantar em que o líder chinês discursou à margem da cimeira da Cooperação Económica da Ásia e Pacífico (APEC).
Um sinal de empatia e de amizade do homem que voltou a ser chamado de “ditador” pelo presidente dos Estados Unidos durante a conferência de imprensa que se seguiu à reunião de quatro horas numa propriedade a sul de São Francisco, na Califórnia. “É um ditador no sentido em que é o homem que dirige um país comunista que se baseia numa forma de governo totalmente diferente da nossa”, comentou Biden.
Após anos de guerra comercial e visões conflituantes no que respeita aos direitos humanos ou a Taiwan, o avistamento e abate do balão espião chinês atirou as relações para o seu pior período desde 1979, quando se deu o reconhecimento bilateral. A guerra da Ucrânia foi um fator extra de falta de sintonia, e que abriu espaço para o aprofundamento da “parceria estratégica” entre Pequim e Moscovo.
Daí a importância do segundo encontro entre Biden e Xi enquanto chefes de Estado, para lá do simbolismo da reaproximação em si. “Virar as costas um ao outro não é uma opção”, disse o líder chinês. “O mundo é suficientemente grande para acolher os dois países, e o sucesso de um país é uma oportunidade para o outro.” Biden revelou que ambos concordaram em ter uma linha aberta. “Devemos pegar no telefone, ligar um para o outro e atenderemos a chamada. Isso é um progresso importante.”
Em agosto de 2022, Pequim cortou as linhas de comunicação militar com os EUA em sinal de protesto pela visita da então presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, a Taiwan. Os dois lados irão agora reabrir os canais militares e diplomáticos. A possibilidade de um incidente degenerar num conflito tinha sido expressa pelo secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, quando recebeu o homólogo chinês, Wang Yi, no mês passado, tendo dito que um avião chinês intercetou um B-52 dos EUA sobre o Mar do Sul da China a apenas três metros de distância.
Da visita chinesa saiu também o anúncio da reabertura de negociações sobre as alterações climáticas, e a criação de um grupo de trabalho para a coordenação entre as agências que combatem o narcotráfico. Washington tem acusado empresas chinesas de fornecerem substâncias químicas para o fabrico ilegal de fentanilo.
Elogiada pelos media chineses, a visita de Xi contribuiu, segundo um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China, para cimentar “a relação bilateral mais importante do mundo”. Para Zhao Minghao, professor de relações internacionais da Universidade de Fudan, em Xangai, “o que Xi queria transmitir era que a China rejeita ver a concorrência como um objetivo político, um jogo final ou a natureza das relações China-EUA”, disse, citado pelo The Washington Post.
Fonte: dn.pt