Estão prontos para a próxima fase? A próxima fase está chegando”, disse o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, aos soldados de infantaria colocados próximos de Gaza. Nos últimos dias, Israel destacou para a fronteira mais de 300 mil militares e reservistas, em antecipação de uma incursão em território palestino. Uma semana depois do ataque do Hamas em Israel, que fez mais de 1.300 mortos e 2.800 feridos, Netanyahu visitou os soldados e um dos kibutz que foi alvo dos terroristas palestinos. Do outro lado da fronteira, à espera dessa incursão, prosseguem os bombardeamentos e os palestinos tentam fugir para o sul onde falta abrigo e comida.
O exército israelita disse neste sábado que está se preparando para entrar em Gaza, sendo que os seus planos ofensivos incluem “um ataque integrado e coordenado por ar, mar e terra”. Segundo um comunicado oficial, “os batalhões do exército israelita e os soldados (…) estão preparados para aumentar a prontidão para as próximas fases da guerra, com ênfase numa operação terrestre significativa”. O objetivo, que tem sido repetido nos últimos dias, é “destruir” o Hamas, que continua disparando rockets em direção a Israel.
Na véspera, o exército já tinha revelado ter feito incursões em Gaza para matar terroristas e tentar encontrar os cerca de 120 reféns que o Hamas levou no dia do ataque, sendo que neste sábado admitiu ter recuperado os corpos de alguns. O grupo terrorista palestino alegou que pelo menos 22 foram mortos nos bombardeamentos que têm sido levados a cabo por Israel em resposta ao ataque de sábado. O conselheiro de segurança do Governo israelita, Tzachi Hanegbi, admitiu “erros” dos serviços de informação prévios a essa ação.
Neste sábado, depois de esgotado um primeiro ultimato – que as Nações Unidas tinham dito que era de 24 horas – as Forças de Defesa israelitas deram até as 16 horas locais (14 horas em Lisboa) para a população de Gaza terminar a retirada para o sul do território. O prazo acabou sem que todos os cerca de 1,1 milhões de pessoas que vivem na Cidade de Gaza e mais a norte tenham conseguido sair.
Os responsáveis do maior hospital da região, que se recusaram a se retirar, diziam que o espaço dava abrigo a pelo menos 35 mil pessoas, esperando escapar aos bombardeamentos israelitas. E houve casos de pessoas que, na fuga, foram alvo dos ataques de Israel, apesar de seguirem numa rota supostamente declarada “segura”.
Hamas se recusa a deixar Gaza
Os palestinos da Faixa de Gaza estão cercados e sob ameaça de uma invasão a qualquer momento de Israel, que os empurra para sul, no território, em direção ao Egito e ao Sinai. Mas encontram fechadas as portas dos países árabes, que reiteram que eles devem ficar nas suas terras, de forma a manter o seu direito a ter um Estado independente, e temem uma nova Nakba – palavra árabe para “catástrofe”, como é conhecido o grande êxodo de 1948 após a criação do Estado de Israel. E que esta gere uma nova onda de refugiados.
Uma fuga para o Egito também é um cenário que o Hamas não contempla. O líder político do grupo terrorista palestino, Ismail Haniyeh, deixou isso claro, numa mensagem televisiva: “Digo aos meus irmãos e irmãs no Egito: a nossa decisão é ficar nas nossas terras”.
Haniyeh, que vive no Qatar, alegou que Israel está tentando tirar os palestinos de Gaza e “recorreu a massacres com o apoio do Governo norte-americano e de vários países europeus” porque o seu “exército covarde” não tem capacidade para enfrentar os combatentes do Hamas.
Entretanto, o exército israelita alega que o grupo terrorista está bloqueando as estradas e impedindo os palestinos de fugirem para sul.
Aqueles que conseguem passar encontram a fronteira de Rafah, com o Egito, fechada, mas os estrangeiros que estão no território têm ali o único ponto possível para fugir. Os egípcios e os israelitas concordaram em deixar sair os cidadãos norte-americanos de Gaza (estima-se o seu número entre 500 e 600), mantendo a fronteira aberta durante cinco horas, não sendo claro se outros estrangeiros vão poder sair.
O ministro dos Negócios Estrangeiros português, João Gomes Cravinho, disse ontem em entrevista ao TVI Jornal que “há um pequeno número” de portugueses e familiares no território. “Já transmitimos essa informação às autoridades egípcias e israelitas e estamos naturalmente expectantes quanto à possibilidade de saída dessas pessoas de Gaza”, afirmou.
Não havendo saída para os palestinos, a relatora especial das Nações Unidas para os Territórios Ocupados, Francesca Albanese, alerta para o sério risco de uma “limpeza étnica em massa”. A advogada italiana acusa tanto o Hamas como Israel de “crimes internacionais” pela morte de civis de ambos os lados, mas alerta para as consequências da operação israelita em Gaza. “Israel já cometeu uma limpeza étnica em massa contra os palestinos sob o nevoeiro da guerra” e está, “em nome da autodefesa, tentando justificar o que constituiria outra limpeza”, afirmou.
A fronteira de Rafah está não só fechada aos palestinos como à entrada de ajuda humanitária. Mais dois aviões, um enviado pela Turquia outro pela Organização Mundial de Saúde, chegaram neste sábado carregados ao Egito, juntando-se a outros três que já estão neste país. Contudo, com Gaza sitiada, não há autorização dos israelitas para poderem entrar, não tendo sido criado qualquer corredor humanitário.
Os palestinos que conseguiram chegar ao sul da Faixa de Gaza estão sem abrigo e sem alimentos, depois de Israel ter cortado há vários dias a entrada de alimentos, mas também a água e a eletricidade ao território onde vivem 2,3 milhões de pessoas. Sem acesso a água potável, o cenário é catastrófico, com as Nações Unidas soando todos os alarmes possíveis e alertando para o risco de doenças que se somariam à ameaça dos bombardeamentos.
susana.f.salvador@dn.pt