Enquanto em várias localidades junto à Faixa de Gaza o exército israelita ainda combatia os militantes do Hamas que na véspera se infiltraram em Israel por terra, ar e mar num ataque sem precedentes lançado pelo grupo extremista palestiniano contra o Estado hebraico, as famílias dos israelitas raptados desesperavam. “Não temos Estado. Há 27 horas que ando à procura da minha filha e ninguém nos está a ajudar”, lamentou Alin Atias, em declarações ao Channel 12. A sua filha era uma das centenas de jovens que estavam numa festa no deserto na madrugada de sábado, quando esta foi interrompida por palestinianos armados que mataram e raptaram muitos dos presentes, levando-os para Gaza. “Benjamin Netanyahu, suplico-lhe, envie helicópteros. Encontre-a, por favor”, lançou Alin num apelo ao primeiro-ministro israelita.
A questão dos reféns – pelo menos uma centena, segundo o governo israelita, incluindo mulheres e crianças – é agora uma das grandes preocupações para Israel, num dilema entre negociar a sua libertação, como esperam os extremistas palestinianos, que contam assim conseguir o regresso de alguns dos seus homens detidos em prisões israelitas, ou lançar uma operação terrestres contra Gaza para os tentar resgatar.
Declarado para já oficialmente o estado de guerra, Netanyahu nomeou o brigadeiro general na reserva Gal Hirsh, veterano da guerra do Líbano em 2006, para gerir a questão dos reféns israelitas.
Ao mesmo tempo, o governo israelita pediu ao Egito, principal mediador entre os palestinianos e o Estado judeu, ajuda nas negociações para a libertação dos israelitas raptados. O Egito está em contacto desde sábado à noite com as partes israelita e palestiniana, bem como com os mediadores em Washington, Amã, Abu Dhabi e Riade, para parar a atual escalada, regressar à mesa de negociações e ouvir as condições de ambas as partes. As principais condições são “parar os ataques palestinianos e entregar todos os israelitas sequestrados e os corpos dos israelitas detidos pelo Hamas”, segundo as fontes, que confirmam as informações relatadas pelo Wall Street Journal.
Numa comunicação ao país, Netanyahu pediu aos israelitas para se prepararem para uma guerra “longa e difícil”. O primeiro-ministro está a ser pressionado pela oposição para formar um governo de união nacional para lidar com a guerra. Benny Ganz, o líder do partido Unidade Nacional, disse ao Haaretz estar disponível para se juntar ao Executivo para formar um “gabinete de guerra para gerir a batalha contra Gaza e outras áreas”.
“Forças inimigas” ainda dentro de Israel
O exército admitia ontem ainda haver militantes palestinianos em solo israelita. “Ainda há forças inimigas dentro de Israel, a maior parte dos infiltrados tentou fugir de volta para Gaza e foram mortos na vedação”, explicou o porta-voz, Daniel Hagari. Os residentes das áreas do Sul onde os combates prosseguiam foram alertados para ficar em casa, enquanto ao mesmo tempo prosseguia a evacuação total destas localidades próximas da Faixa de Gaza. Israel enviou dezenas de milhares de soldados com a missão de “libertar reféns” e “matar cada terrorista presente em Israel”, explicou Hagari.
Apanhado de surpresa pelo ataque do Hamas, o grupo extremista que governa a Faixa de Gaza desde 2007, o exército israelita demorou a reagir. Mas neste domingo as tropas – inclusive reservistas que estavam em greve até agora em protesto contra as reformas do governo – estavam a mobilizar-se, fazendo prever uma operação terrestre contra o território palestiniano. O próprio Netanyahu falou numa retaliação “com uma escala e intensidade como o inimigo não sentiu até agora”. E prometeu chegar “a todos os sítios onde o Hamas se esconde
Para já, os ataques contra Gaza prosseguiam pelo ar, com a aviação israelita a afirmar ter atingido mais de 800 alvos ligados ao Hamas. Mas num pequeno território – com apenas 20 km por 40 km – onde vivem mais de 2,3 milhões de pessoas os ataques israelitas também atingiram a população civil, com muitas pessoas a tentar fugir ou a procurar refúgio nas escolas geridas pela agência da ONU para os refugiados palestinianos. Segundo a UNRWA, havia este domingo mais de 20 mil deslocados. Um porta-voz do governo do Hamas afirmou terem sido destruídos 13 torres e edifícios residenciais, com outras 159 unidades habitacionais também arrasadas, além de mais de 1200 apartamentos parcialmente atingidos.
As autoridades de Gaza falavam em 413 mortos, entre os quais 78 crianças, e mais de 2300 feridos, enquanto do lado israelita as vítimas mortais subiam para mais de 700, com mais de 2200 feridos internados nos hospitais, 350 dos quais em estado grave.
A braços com os combates no Sul, Israel começou o dia sob fogo também no Norte, com o grupo xiita libanês Hezbollah a disparar mísseis contra território israelita sem causar vítimas. Israel respondeu com disparos de artilharia para o outro lado da fronteira patrulhada pelas Nações Unidas. “Alertamos o Hezbollah para não se meter nisto”, afirmou o porta-voz do exército israelita, Richard Hecht, sublinhando que “se eles vierem, estamos prontos”.
Depois do ataque do Hamas no sábado, que começou com o disparo de milhares de rockets, o alargar do conflito é um dos receios, sobretudo o reacender das tensões na fronteira entre Israel e o Líbano.
Solidariedade com um lado e com o outro
A nível internacional, os velhos inimigos de Israel apressaram-se a mostrar a sua solidariedade com os palestinianos. No Líbano, no Iémen, no Iraque, no Paquistão ou no Irão, muitos saíram às ruas para protestar contra a operação israelita na Faixa de Gaza. Em Teerão, o presidente, Ebrahim Raisi, defendeu “o direito dos palestinianos à autodefesa” e alertou Israel de que poderá ter de responder por estar a “pôr em perigo a segurança da região”. E deixou um apelo aos governos muçulmanos para “apoiarem a nação palestiniana”, elogiando a “resistência” do Hamas e da Jihad Islâmica (outro grupo extremista palestiniano).
Precisamente na região, Egito e Jordânia pediram a intensificação dos “esforços regionais e internacionais” para travar a escalada de violência entre Gaza e Israel. O presidente, Abdel Fatah al-Sissi, e o rei, Abdullah II, acordaram também em intensificar a comunicação entre os seus países para “avançar no sentido de uma solução global e justa para a questão palestiniana e com base na solução de dois Estados”.
O conflito entretanto começou já a extravasar as fronteiras de Israel e dos territórios palestinianos. Em Alexandria, no Egito, dois turistas israelitas foram mortos a tiro por um agente da polícia. E países como França e Reino Unido, onde existem grandes comunidades judaicas, já começaram a reforçar a segurança em torno das mesquitas e das escolas judaicas.
No Ocidente, as reações foram de solidariedade com Israel. Ao fim do dia, os Estados Unidos, o seu principal aliado, anunciaram o envio de ajuda militar. Depois de uma conversa telefónica com Netanyahu, o presidente Joe Biden disse ter ordenado à frota norte-americana no Mediterrâneo – que inclui o porta-aviões USS Gerald R. Ford – que se aproxime da costa de Israel e ter reforçado os esquadrões de aviões de caça na região. Afirmando o seu “apoio sólido como uma rocha”, Biden alertou as outras partes para ficarem fora do conflito.
Fonte: dn.pt