Numa noite, um navio de assalto anfíbio e um submarino em Sebastopol; na seguinte um sistema de defesa aéreo em Yevpatoria. A Ucrânia está a concentrar esforços na Crimeia e as forças russas não parecem ter argumentos para manter a península sob controlo no que respeita à segurança aérea. Já a porta-voz das forças armadas ucranianas no sul do território disse que é objetivo forçar os russos a retirar da margem esquerda do Dniepre pelo menos 10 a 15 quilómetros para pôr cobro aos ataques diários de artilharia que atingem civis nas localidades na margem sul, já totalmente retomada.
Há 13 meses, o presidente ucraniano reconheceu que não podia avançar com uma data, mas a libertação da península anexada pelos russos iria ser uma realidade. “A guerra contra a Ucrânia e contra a Europa começou na Crimeia e vai acabar na Crimeia”, declarou. Apesar de as forças de Kiev continuarem a lutar contra um inimigo com uma projeção militar muito superior, e sem contar com o armamento que desejava em quantidade e menos ainda em qualidade (os aviões de caça F-16 e os mísseis de longo alcance ATACMS e Taurus), mantêm a capacidade de atingir alvos simbólicos e estratégicos.
Em 23 de agosto, os russos começaram a perder o pé na península. Um ataque ao extremo ocidental da Crimeia, junto de Olenivka, destruiu um sistema de defesa aéreo S-400 Triumph. Ao que foi noticiado nos meios especializados, o ataque foi realizado com drones e com mísseis Neptune. Este último foi concebido pelos ucranianos como antinavio – abateu o navio-almirante da frota do Mar Negro, o Moskva -, mas terá sido entretanto adaptado para uso terra-terra, com um alcance de 350 quilómetros.
O mesmo plano foi repetido, e de novo com êxito, nas primeiras horas de quinta-feira. Desta vez, o ataque deu-se numa base em Yevpatoria, dezenas de quilómetros a sudoeste de Olenivka, e o alvo foi também o mesmo. Na segunda-feira, as forças especiais ucranianas retomaram as torres Boyko, plataformas de exploração de hidrocarbonetos situadas entre Odessa e a Crimeia. Estavam a servir de base avançada, com heliportos em uso, bem como um radar e locais potenciais para instalar sistemas de mísseis.
A destruição dos sistemas de defesa aérea e a tomada das plataformas fazem parte do que o conselheiro presidencial Mikhaylo Podolyak chamou de “preparação preliminar para a desocupação do território”. O objetivo destes ataques é “abrir os céus da península para destruir as infraestruturas militares russas”; o que se conjuga com a interrupção da logística, o que inclui novos ataques a “objetos ilegais”, ou seja, a ponte do estreito de Kerch, que liga a Crimeia à Rússia; e ainda negar à Rússia a superioridade naval no Mar Negro, “destruindo os navios de guerra e as infraestruturas de reparação”.
As forças terrestres prosseguem numa contraofensiva em que os progressos são muito mais lentos do que o ambicionado – levando até a vice-ministra da Defesa Hanna Maliar a anunciar a libertação de Andriivka, não longe de Bakhmut, só para ser corrigida de imediato pelo comando ucraniano no local.
Já Natalia Humeniuk, porta-voz das forças do sul, mencionou a prioridade atual: “Continuamos a afastar o inimigo, de modo a que a faixa da margem esquerda [do rio Dniepre] fique completamente desimpedida pelo menos ao longo de 10 a 15 quilómetros. Isto reduzirá drasticamente o número de ataques na margem direita e tornará a vida mais fácil para os residentes das povoações ao longo da costa.” Horas antes, uma criança de seis anos foi morta e o seu irmão de 13 ficou gravemente ferido na aldeia de Novodmytrivka, na região de Kherson.
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