Quarta acusação. Milionário Trump vs. RICO da Geórgia

A quarta acusação criminal ao candidato republicano é construída pela procuradora da Geórgia Fani Willis com base na lei sobre organizações corruptas e influenciadas por extorsão (RICO), usada contra chefes mafiosos e redes criminosas.

Donald Trump e mais 18 pessoas foram indiciadas de um total de 41 crimes pela procuradora do condado de Fulton (onde se situa Atlanta, na Geórgia) Fani Willis na segunda-feira à noite, depois de um grande júri ter concordado com o resultado da investigação. Do ex-presidente a um capelão da polícia, todos receberam uma acusação em comum: violação da lei estadual sobre organizações corruptas e influenciadas por extorsão (RICO, no acrónimo em inglês), uma adaptação da lei federal criada na década de 70 para perseguir a máfia e o crime organizado em geral.

“Trump e os outros arguidos indiciados nesta acusação recusaram-se a aceitar que Trump perdeu e, consciente e deliberadamente, associaram-se numa conspiração para alterar ilegalmente o resultado das eleições em benefício de Trump”, lê-se no documento de 98 páginas. Além dos acusados, há mais 30 envolvidos no “esquema criminoso” que não foram indiciados – ou porque as provas não eram suficientes, ou porque colaboraram com a justiça.

A acusação pode ser divida em quatro esquemas centrais: a pressão para que os funcionários da Geórgia atribuíssem os votos do estado a Trump; a criação de falsas listas de eleitores para se substituírem aos verdadeiros que integram o Colégio Eleitoral; o acesso a máquinas de voto no condado rural de Coffee para alegar roubo de votos; e obstrução e encobrimento durante a investigação.

A democrata Fani Willis iniciou funções como procuradora distrital no dia 1 de janeiro de 2021. Dois dias depois foi noticiado pelo Washington Post que Trump tinha telefonado ao secretário de Estado da Geórgia Brad Raffensperger para “encontrar 11780 votos”, um número a mais com o qual perdeu para Joe Biden naquele estado. Um mês depois anunciou o início da investigação que culminou agora com a indiciação do ex-presidente, de vários advogados e de outras pessoas da equipa de Trump, além de outras figuras.

Os indiciados têm até dia 25 para se apresentarem perante as autoridades para serem detidos, identificados e por fim ouvirem as acusações e os termos em que – em princípio – ficam em liberdade. Ao contrário do que sucedeu nas outras três acusações de que foi alvo, Donald Trump poderá ser sujeito ao tratamento previsto na lei, ou seja, a recolha de impressões digitais e de fotografias e um rastreio médico nas instalações prisionais. “A menos que alguém me diga o contrário, vamos seguir as nossas práticas normais”, disse o xerife Patrick Labat.

No início do mês, o procurador especial Jack Smith havia feito a acusação mais grave até agora a Trump: conspiração e obstrução para impedir a transferência de poder. Mas a acusação federal deixou de fora as acusações mais demolidoras – insurreição e conspiração sediciosa – no que é visto como uma forma de conseguir um julgamento expedito e uma culpabilidade fácil de provar em tribunal. Smith, que se baseou na investigação da comissão da Câmara dos Representantes sobre o 6 de janeiro, também optou por deixar de fora, pelo menos para já, os seis co-conspiradores.

Já Willis e a sua equipa percorreram um caminho mais longo e complexo. Perante a recusa de muitas testemunhas em colaborarem – como por exemplo o governador Brian Kemp, o senador Lindsey Graham ou Mark Meadows, o chefe de gabinete da Casa Branca à época -, quase um ano depois de ter lançado o inquérito Willis solicitou a constituição de um grande júri para fins especiais. Este órgão de investigação, composto por 23 jurados entre residentes de Atlanta, tinha plenos poderes de intimação, só não podia emitir acusações, mas recomendações sobre o caso.

A procuradora optou por alargar a investigação ao máximo, através da RICO. A versão da lei naquele estado dá ampla liberdade de ação aos procuradores para juntarem uma variedade de alegados crimes, incluindo violações de leis estaduais e federais, inclusive atividades noutros estados. Além disso, a lei não exige que os suspeitos tenham estado na Geórgia para serem acusados. Para avançar com o caso de extorsão, os procuradores precisam de pelo menos dois potenciais crimes em prol de um esquema.

Willis chegou ao cargo depois de ter usado pelo menos em duas ocasiões a lei RICO. Num caso conseguiu a condenação de professores que inflacionavam notas de testes e noutro, mais recente, do processo contra o rapper Young Thug, acusado de ser um dos responsáveis por um bando suspeito de 200 crimes.

A procuradora, que espera ver o julgamento começar no prazo de seis meses, avisara em janeiro: “As alegações são muito graves. Se indiciadas e condenadas, as pessoas enfrentam penas de prisão”, disse ao Washington Post no seu gabinete onde o lema “A integridade conta” se lê em vários sítios. A violação da lei RICO pode ser punida com pena de prisão até 20 anos. Ao invés de uma condenação ao nível federal, nem a Casa Branca nem o Departamento de Justiça têm poderes para perdoar ou para arquivar o caso. Além disso, a lei na Geórgia só permite uma revisão de pena ao fim de cinco anos do cumprimento da mesma.

Ironia do destino, Rudolph Giuliani, o homem que se notabilizou pelo uso da lei, foi agora acusado de infringi-la. No início dos anos 80, enquanto procurador federal em Nova Iorque, incriminou dezenas de mafiosos com acusações aparentemente sem relação, mas todos sob o mesmo esquema. O sucesso foi a rampa de lançamento para a sua carreira como mayor da cidade.

cesar.avo@dn.pt por Dn.pt

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