Atentado em Tel aviv em resposta à operação militar na Cisjordânia

Ao final do segundo dia, Telavive deu por terminada a maior incursão do exército israelita em quase duas décadas na Cisjordânia. A Palestina lamenta 12 mortos, Israel oito feridos num atentado - e conta dezenas de suspeitos detidos e milhares de bombas apreendidas.

Um ataque por atropelamento e à facada deixou oito pessoas feridas em Telavive, tendo o autor sido abatido no local. Na véspera, depois do início da maior operação militar israelita na Cisjordânia desde 2006, com recurso a helicópteros, drones, veículos blindados e retroescavadoras, e que se saldou em 11 mortes, grupos como a Jihad Islâmica prometeram “atingir o inimigo”. No final do segundo dia da incursão militar, Telavive anunciou o início da retirada enquanto se deram novos confrontos e uma troca de tiros no exterior do Hospital Khalil Suleiman, no campo de refugiados.

“O heroico ataque em Telavive é a primeira resposta aos crimes da ocupação contra o nosso povo em Jenin”, disse o porta-voz do Hamas, Hazem Qassem, sobre o ataque terrorista junto de uma paragem de autocarro na capital israelita. O comandante da polícia de Telavive, Ami Eshed, declarou que o atacante era um palestiniano na casa dos 20 anos, residente na região de Hebron, na Cisjordânia, e que agiu sozinho.

Segundo o Ministério da Saúde da Palestina, um ataque aéreo num cemitério em Jenin matou um homem, a 12.ª vítima mortal desde o início do assalto israelita que Telavive alega ter como finalidade combater as infraestruturas terroristas naquela cidade e no campo de refugiados adjacente.

Ao fim da tarde, o primeiro-ministro israelita anunciou que “a missão” estava a ser completada e advertiu que não era uma ação isolada. “Continuaremos a erradicar o terrorismo enquanto for necessário, não permitiremos que Jenin se torne um santuário para o terrorismo”, disse Benjamin Netanyahu enquanto visitava um posto de controlo perto de Salem, na Cisjordânia.

Ao seu lado, o ministro da Defesa, Yoav Gallant, deu mais pormenores sobre a operação, ao afirmar terem sido apreendidas “milhares de bombas, entre grandes e pequenas, e destruídas dezenas de fábricas, oficinas e laboratórios”. Para Gallant, “nos dois últimos anos, Jenin tornou-se numa fábrica de terror. Agora isso acabou”, garantiu.

A operação visava localizar 150 suspeitos e esperava enfrentar cerca de 300 combatentes, adiantara o porta-voz do exército israelita. No entanto, cerca de metade dos suspeitos não foram localizados, tendo conseguido esconder-se ou escapado entre os cerca de três mil civis que fugiram dos ataques.

Apesar de o exército, em comentários à imprensa, se ter mostrado surpreendido com a falta de reação dos militantes palestinianos, no final do dia israelitas e palestinianos trocavam tiros junto do hospital local, pondo em dúvida se o calendário para o fim da operação seria afetado.

Críticas da ONU

Quem pelo segundo dia consecutivo reagiu foi o chefe dos direitos humanos das Nações Unidas, Volker Türk. “A recente operação na Cisjordânia ocupada e o ataque com um carro em Telavive sublinham de forma preocupante um padrão de acontecimentos demasiado familiar: a violência só gera mais violência. Os assassínios, as mutilações e a destruição de bens têm de parar”, afirmou em comunicado o austríaco.

No dia anterior, Türk questionou a utilização de meios militares pesados, “armamento geralmente associado à condução de hostilidades armadas em vez de uma situação de aplicação da lei” e disse que Israel deve “urgentemente redefinir as suas políticas e ações na Cisjordânia em conformidade com as normas internacionais em matéria de direitos humanos”.

Em resposta à operação militar israelita, a Autoridade Palestiniana parou os contactos e reuniões com Telavive e manteve suspensa a coordenação de segurança entre palestinianos e israelitas. Os dirigentes palestinianos decidiram ainda limitar as suas relações com os Estados Unidos devido ao que consideram incapacidade de Washington para exercer pressão sobre Israel.

Jenin, símbolo da resistência

Fundado em 1953, o campo de refugiados de Jenin abriga cerca de 18 mil residentes que fazem parte dos 760 mil palestinianos que fugiram ou foram expulsos de suas casas, durante a criação do Estado de Israel em 1948, um evento que os palestinos chamam de nakba (“catástrofe”). Localizado no norte da Cisjordânia ocupada, cobre uma área de 0,43 km2, segundo a Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos no Médio Oriente (UNRWA). Com o tempo, as barracas foram substituídas por casas, e o local hoje parece mais um bairro da cidade de Jenin.

Uma das figuras mais conhecidas neste campo é Zakaria Zubeidi, ex-líder das Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa, o braço armado do Partido Fatah, do presidente palestiniano Mahmud Abbas. Zubeidi esteve por muito tempo na lista dos mais procurados de Israel, por ser responsável por inúmeros ataques contra civis israelitas. A fuga da prisão de Gilboa, em Israel, em 2021, onde estava detido por “terrorismo” desde 2019, e a busca subsequente de vários dias rendeu-lhe uma fama de herói entre os palestinianos. Em 2022, Raad Hazem, outro habitante do campo, matou três israelitas durante um tiroteio num bairro de Telavive e foi abatido. Fotos deles e de outros “mártires” mortos por soldados israelitas estão espalhadas nas paredes do campo e nas entradas das ruas.

Em 2002, Israel sitiou Jenin por mais de um mês durante uma operação militar na Cisjordânia. Cinquenta e dois palestinianos e 23 soldados israelitas morreram nesses combates. Mais de 400 casas foram destruídas e mais de um quarto da população ficou nas ruas, segundo a UNRWA.

Shireen Abu Akleh, uma conhecida jornalista da rede de televisão Al Jazeera, cobria uma incursão israelita nesse campo quando foi baleada e morreu, em 11 de maio de 2022. A jornalista usava um capacete e colete à prova de balas com a palavra Press (imprensa) estampada. Depois de o governo israelita ter alegado de início que Abu Akleh teria sido confundida com um soldado seu por militantes palestinianos, imagens e testemunhos demonstraram que foi vítima de balas israelitas – e que não tinha ninguém armado ao pé de si. Um ano depois, Telavive pediu desculpas pela morte da mulher de cidadania palestiniana e norte-americana.

Israel afirma que pelo menos 50 ataques com armas de fogo foram lançados de Jenin e seus arredores desde o início do ano. Esses ataques letais contra alvos israelitas levaram o exército a realizar várias incursões ao campo de refugiados, onde a presença da Autoridade Palestina é escassa. Israel afirma que a “Brigada Jenin”, grupo armado local acusado pelos ataques, conta com o apoio do Irão e que inclui, entre os membros, militantes do movimento islamista Hamas, que governa a Faixa de Gaza, assim como da Jihad Islâmica e da Fatah.

Com AFP

cesar.avo@dn.pt

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